Inquéritos

A revolta dos sertanejos

A "guerra dos Canudos" iniciou-se na sequência de alegadas pregações anti-republicanas nas quais António Conselheiro é seguido por centenas de sertanejos que se revoltam contra o pagamento de impostos envolvendo-se em confrontos com destacamentos policiais dos quais saem vitoriosos.

O conflito agudiza-se em Janeiro de 1897 quando o governo federal se vê obrigado a enviar sucessivas expedições a Canudos, pequena povoação baiana considerada nos círculos republicanos como um reduto monarquista. Os revoltosos conseguem resistir de forma heróica aos ataques das tropas federais, melhor equipadas e em maior número, só claudicando depois da morte de António Conselheiro, na sequência de uma diarreia ou do agravamento de ferimentos entretanto sofridos. Em Outubro desse ano, uma chacina poria fim à guerra tendo muitos sertanejos sido selvaticamente degolados pelas forças vencedoras.

De todos estes episódios foi testemunha o enviado especial Euclides da Cunha que sobre eles escreveu um total de 25 artigos para "O Estado de S. Paulo" onde nos deixa comentários e informações preciosas sobre o conflito e a região. A 4 de Setembro 1897, por exemplo, descreve-nos algumas das dificuldades sentidas pelos militares do exército federal: "são dez horas da noite. Traço rapidamente estas notas sob a ramagem opulenta de um juazeiro, enquanto, em torno, todo o acampamento dorme (...) Não se pode avaliar de longe, o que é uma viagem nestas regiões estéreis onde não se encontra o mais exíguo regato, o mais insignificante filete de água".

Alguns dias depois, a 7 de Setembro, dá-nos conta da boa organização dos revoltosos: "às vezes toda a linha das nossas forças, que tem uma extensão aproximada de dois quilómetros, é, simultaneamente, à noite atacada vigorosamente em todos os pontos (...) ninguém deve acreditar que os jagunços combatem sem ordem; há leis naquele tumulto aparente; na ordem dispersa em que se dispõem, invariavelmente, o trilar dos apitos determina evoluções rápidas correctamente executadas - dilatando, encurtando, fazendo avançar ou retroceder, movimentando em todos os sentidos, vertiginosamente, as linhas de atiradores perfeitamente dispostas".

A 25 de Setembro, refere-se à "tenaz resistência" da população de Canudos embora as posições conquistadas pelas tropas federais fossem já "vantajosamente sustentadas" apertando-se, cada vez mais, o cerco. "Os tiroteios persistentes continuam, tendo abrandado apenas esta noite. A artilharia bombardeia compassadamente. É certo o próximo desenlace da luta", acrescenta Euclides da Cunha.

Na verdade, a guerra terminaria poucos dias depois, a 5 de Outubro de 1887, com a morte dos últimos resistentes: "Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a história, resistiu até ao esgotamento completo. Expugnado palmo a palmo, na precisão integral do termo, caiu no dia 5, ao entardecer, quando caíram seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente 5000 soldados".

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