Inquéritos

Castelo da Lousa (Mourão)

Um dos mais notáveis monumentos existentes no concelho de Mourão, o Castelo da Lousa, será submergido pelas águas da albufeira de Alqueva. Restam poucas oportunidades para visitar este Monumento Nacional cujo difícil acesso é feito pela Aldeia da Luz.

Construído numa acentuada escarpa sobre o rio Guadiana, o Castelo da Lousa é uma pequena fortificação romana de planta rectangular identificada em 1961 por Joaquim Bação Leal e alvo de intervenções arqueológicas desde o ano seguinte. Até essa época, o monumento era referido como sendo um antigo castro lusitano. É nestes termos que se lhe refere o general João de Almeida no "Roteiro dos Monumentos Militares Portugueses", reconhecendo desconhecer-se a história da fortaleza mas, "dada a sua situação e a natureza dos vestígios, é de presumir que na origem tivesse consistido num castro lusitano".

Num artigo publicado em 1965 no "Boletim da Junta Distrital de Évora", Afonso do Paço e o próprio Joaquim Bação Leal dão-nos conta da singularidade do Castelo da Lousa - "não se conhecia igual na nossa península, conforme o testemunho de mestres que consultámos" - e referem algumas das conclusões do levantamento arqueológico ali efectuado: "as muralhas exteriores, com dois metros de espessura, davam ao conjunto grande segurança, e estavam providas de seteiras, de que ainda encontrámos apreciáveis vestígios. É provável que as funções destas fossem duplas, servindo para a defesa e ao mesmo tempo para a iluminação".

Inteiramente construído com placas de xisto, material de tal forma abundante na região que a construção amuralhada chega, nalguns locais, a confundir-se com o terreno envolvente, não se sabendo precisar com exactidão onde termina uma e começa outro, o interior do castelo já não se encontrava intacto quando os arqueólogos iniciaram os primeiros trabalhos de escavação.

Acrescentam Afonso do Paço e Joaquim Bação Leal: "havia alguns anos que um grupo de visionários da Amareleja, freguesia do extremo meridional do concelho de Moura, se deslocara ao castelo levando carroças com ferramentas, roupas e mantimentos, além de mulheres para os serviços de cozinha e outros. Durante alguns dias, bem comidos e bem bebidos, cavaram e escavacaram muito do que por ali existia, na ânsia de enriquecerem depressa, encontrando o tal tesouro escondido. Esgotados os víveres, cansados e desiludidos, retiraram-se, deixando profundos sinais de tão negregada aventura".

Ainda assim, as escavações realizadas na década de 60 sob o patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian, permitiram aos investigadores recolher diversos vestígios da ocupação romana (estudados por Adília e Jorge Alarcão, da Universidade de Coimbra), entre os quais abundantes fragmentos de ânforas, cerâmicas "sigillatas" e campanienses, pesos de barro, pesadas mós manuais e moedas, designadamente dois denários da família JVLIA, datados de 50 antes de Cristo (a.C.) e 47 a.C., e dois asses, o mais recente dos quais de 27 a.C.

"Temos a impressão - acrescentam os autores - que no Castelo da Lousa não se travaram combates. A guarnição militar que ali viveu cumpriu enquanto necessário a sua missão de vigilância junto ao rio, até que, tornando-se desnecessária, retirou pacificamente. O termo da sua missão não teria sido violento. Não há qualquer sinal de incêndio ou destruição".

Ao abandonar o local, os romanos levaram consigo os objectos transportáveis deixando apenas alguns, poucos, vestígios da sua presença. "Sobre estes restos de abandono caiu uma camada de poeiras, bem definidas na base dos compartimentos e corredores. Vieram depois as ruínas e desmoronamentos que tudo acabaram por cobrir", resumem Afonso do Paço e Joaquim Bação Leal.

Desta forma, o Castelo da Lousa surge-nos directamente relacionado com o vasto conjunto de pequenas fortificações romanas ("castella") existentes numa vasta área do Sul de Portugal, do concelho de Santiago do Cacém ao de Alcoutim.

Por sua vez, o investigador alemão Jurgen Wahl que, na década de 80, estudou profundamente esta fortificação, adianta outra explicação relativa à sua possível funcionalidade: serviria de local de abrigo contra os bandos de salteadores que actuavam "fora dos campos de operações, portanto, dificilmente controláveis". Aliás, acrescenta, quando cerca de 13 a 7 a.C., foram criadas as "condições de organização para subordinar a Lusitânia, na qualidade de província independente", verificou-se o abandono do Castelo da Lousa.

Nos últimos anos, alguns autores têm posto em causa a natureza militar destas estruturas, pois aquando da sua edificação toda a região já se encontrava pacificada, e atribuem-lhe funções agrícolas - seria este o primeiro modelo de exploração agrícola romano no actual território português.

Independentemente das conjecturas sobre a sua funcionalidade, a próxima submersão do monumento constitui um dos grandes impactes negativos decorrentes da construção do empreendimento de Alqueva. A dada altura, chegou a analisar-se a possibilidade da sua transferência para outro local mas, do ponto de vista técnico, esta solução revelou-se impraticável tendo em conta os materiais utilizados na construção e sua perfeita implantação no terreno.

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